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Dylvan Castro de Araújo (TELSIRIO ALENCAR/PAUTA JUDICIAL)
DIREITO E JUSTIÇA NA ENCRUZILHADA Direito e Justiça na Encruzilhada Autor: DYLVAN CASTRO DE ARAÚJO, Mestre em Direito e Consultor Jurídico abordará aqui nesse espaço vários temas que serão debatidos através de seus artigos, claro, recheados de Direito e Justiça na Encruzilhada de cada palavra.

A poesia trágica do cárcere e a falência da ressocialização

Círculo de Ferro: a poesia trágica do cárcere e a falência da ressocialização

Foto: CNJA  poesia trágica do cárcere e a falência da ressocialização
A poesia trágica do cárcere e a falência da ressocialização

As celas não contêm apenas corpos — aprisionam também futuros.

Dentro de cada grade, jaz uma promessa constitucional esquecida, uma utopia penal enterrada sob os escombros da reincidência. O cárcere, que deveria ser espaço de transição entre o erro e o recomeço, converte-se, dia após dia, em fábrica de retornos, onde o que sai volta, e o que volta já não sonha.

A Constituição Federal ergue, em seu art. 1º, a dignidade da pessoa humana como fundamento da República. A Lei de Execução Penal fala em educação, trabalho, reintegração. Mas o discurso normativo não atravessa os muros do presídio. O que chega lá é o abandono.

A ressocialização é ficção jurídica. E a reincidência, seu capítulo final.

A cada sentença, acredita-se que a pena reeducará. Mas como educar no caos? Como reconstituir vínculos em celas superlotadas, onde a violência é rotina e o Estado, presença punitiva, mas ausente enquanto garantidor de direitos?

Dentro das prisões, a realidade não é de reconstrução, mas de decomposição. Decompõem-se os afetos, os projetos, os laços familiares. O sujeito não é acompanhado; é descartado. A culpa é fixada, mas a esperança não é cultivada. E quando esse indivíduo retorna à sociedade, faz isso com a bagagem do abandono e o estigma da marca penal.

E o mundo, do lado de fora, o recebe com portas fechadas e olhares armados.
Sem trabalho, sem acesso a políticas públicas, sem apoio psíquico, social ou comunitário, o egresso volta a caminhar sobre o mesmo chão que o levou à prisão. E quando reincide, o sistema — cínico — o culpa por não ter aprendido.

Mas o que, afinal, ele deveria ter aprendido?

O silêncio? A submissão? O desespero?

Não há pedagogia no sofrimento.

Não há ética na indiferença.

A reincidência não é escolha individual, mas reflexo institucional. Ela grita, em cada número estatístico, o que não se quer ouvir: a prisão falhou. E falhou porque quis ensinar pela dor, e não pela dignidade. Quis controlar pelo medo, e não transformar pelo afeto. Quis punir em massa, e não reabilitar em singular.

O sistema penal brasileiro, assim, gira em círculos: prende, solta, prende de novo.
É o círculo de ferro, onde a liberdade é miragem e a justiça, muitas vezes, instrumento de exclusão.

Enquanto não se investir em educação carcerária, em saúde mental, em oportunidades reais para o egresso, falar em ressocialização será como pintar flores em muros em ruínas.
Belo no discurso, inútil na prática.

A pena que não ressocializa é só vingança formalizada.

E o Estado que prende sem reabilitar não protege — apenas perpetua o ciclo da miséria e da criminalidade.

Quebrar esse ciclo exige coragem institucional, sensibilidade social e fidelidade à Constituição. Porque, no fim, ressocializar não é devolver alguém à sociedade — é devolver-lhe a condição de sujeito. E isso começa com o reconhecimento de que não se repara uma vida com ferro.

Autor: DYLVAN CASTRO

Consultor Jurídico e Mestre em Direito

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Encerrada em 31/05/2020 11:41

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