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Jurista conceitua no aspecto Teleológico autonomia da Policia Federal

POR UM CONCEITO TELEOLÓGICO DE AUTONOMIA NA POLICIA JUDICIÁRIA DA UNIÃO

"A nomeação de Alexandre Ramagem para Diretor Geral da Polícia Federal e a suspensão de referida decisão pelo STF proferida no Mandado de Segurança nº 37097, impetrado pelo PDT dever ser compreendida dentro de um contexto político/jurídico e por que não sócioeconômico de entendimento da realidade.

Foto: DivulgaçãoAdvogado George Magno
Advogado George Magno

 Desta feita uma analise histórica nos fornece a chave para avaliarmos a dimensão dos atos acima narrados e suas consequências. Partindo do pressuposto supracitado, cumpre ressaltar que, na época de D. João VI, fora criada por este a Intendência Geral de Polícia da Corte para proteger seu reinado. Naquele tempo, o Chefe Maior do Brasil reunira as polícias provinciais unificando-as com o intuito de proteger o seu Governo.

Passado esse momento embrionário de unificação das policias com o intuito de proteger os interesses da Corte, cumpre destacar que, no período do Estado do Novo, com Vargas, mais precisamente no ano de 1944, fora criado o Departamento Federal da Polícia Pública, segundo alguns historiadores, o nascedouro da Polícia Federal.

Tal órgão, todavia, desvinculara-se dos moldes como fora criado, haja vista que, em 1946, quando o nosso primeiro regime Ditatorial já havia encerrado, a Constituição promulgada naquele mesmo ano retirara a maior parte do poder dessa Polícia centralizada. Entretanto a Policia Federal e sua organização estrutural da forma como conhecemos nos dias atuais fora consolidada com o advento da lei 4.483/64.

O viés arbitrário para proteger o Rei Português durante sua permanência no Brasil fora revigorado com a criação, por exemplo, da Divisão de Ordem Política e Social (DOPS), desmembramento este, dentre outras estruturas do aparelho policial à época, responsável segundo Relatório Final da Comissão da Verdade, pela prisão, tortura e morte de centenas de pessoas no regime militar. Vale lembrar, ainda, que a Lei 4.483/64 (art. § 1º) atribuiu ao Presidente da República a prerrogativa de nomear o Diretor Geral da Polícia Federal, subordinando o mesmo ao Ministério da Justiça sem, contudo, estabelecer critérios objetivos de seleção, os quais pudessem aferir os requisitos para desempenho do cargo.

 A Lei 13.047/16, sancionada pela Presidente Dilma Rousseff acrescentara à prerrogativa supramencionada a condição de que o mesmo fosse Delegado da Classe Especial (art. 2º-C). Isto posto, observa-se que a tão sonhada autonomia ora reclamada pela entidade que representa os Delegados Federais não passava de um sonho longínquo daquela realidade imposta pelo Regime Ditatorial.

Essa liberdade de atuação fora restabelecida, de certa forma com a Constituição cidadã de 1988, a qual redimensionou a Policia Federal para defender os interesses da União. Nessa situação, pelo menos em tese, a Polícia Federal teria autonomia para atuar de forma livre no combate às mazelas que causassem prejuízo à sociedade.

 E assim o fez desde então com menor variação no seu grau de liberdade, como instrumento de enfrentamento do crime. Não se pode olvidar, por conseguinte, que em governos anteriores recentes, a Polícia Federal teve total independência para investigar, conforme ressaltado pelo ex Ministro da Justiça, tendo até então a polícia judiciária da União, na prática, garantida a autonomia que lhe fora atribuída pelo texto constitucional de 1988. Dessa maneira, diante da iminente ameaça à nossa Democracia, fruto de um governo que apresenta sérias dificuldades em administrar a crise sanitária e outras não menos importantes em nosso contexto, uma nova leitura do aparelho policial, neste caso, da polícia judiciária se faz necessária.

 O conjunto de ações desenvolvidas recentemente pela Polícia Federal (operação lava jato e outras inúmeras operações exitosas no combate à corrupção) legitima as propostas construídas dentro da Polícia Federal para um revigoramento da autonomia daquele órgão. Dentre elas um mandato fixo para o cargo de Diretor Geral da Polícia Federal, sendo este escolhido com base em uma lista tríplice e tendo poderes para nomeações e exonerações dos cargos internos daquela instituição, observados critérios objetivos mínimos e definidos por lei.

Insta guisar, por fim, que tramita no Congresso Nacional a PEC 412/2009, que propõe autonomia funcional e administrativa à Polícia Federal (ainda aguardando parecer da CCJ). Todavia, aquela já encontra objeções no meio jurídico, dentre os quais: o Ministério Público Federal (MPF), a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) e a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef).

 Em resumo, referidas entidades e associações alertam para a possibilidade de transformação da autonomia garantida pelo texto constitucional em poder sem controle, haja vista que, de acordo com a PEC 412/2009, esta não estaria subordinada a nenhum outro órgão público, mitigando, por exemplo, o que preconiza o art. 129, VII e VIII da nossa Carta Magna no que concerne ao sistema de freios e contrapesos. Vale destacar, aqui, que o referido dispositivo legal atribui ao Ministério Público o controle externo da atividade policial.

 No que tange ao campo da autonomia orçamentária, esta ocorreria por meio de uma vinculação constitucional de sua receita, consentâneo ocorre com a Saúde (art. 198,§ 1º, I) e com a Educação (art.212), livrando-se dessa forma, de um controle estranho que pudesse atentar contra os princípios erigidos pela nossa Lei Maior.

 Nesse caso, apontam os críticos, tal medida blindaria eventuais cortes, bem como evitaria que outros poderes pudessem dispor do orçamento da maneira que lhe aprouvessem em detrimento das ações da Polícia Judiciária da União.  Essas considerações acima nos ajudam a compreender a decisão proferida pela nossa Corte Maior que suspendera a nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de Diretor Geral da Polícia Federal.

Sempre lembrando, que o Direito, enquanto Ciência e experiência jurídica reveste-se de uma realidade dinâmica, devendo acompanhar a velocidade dos fatos e acontecimentos que o circundam no intuito de responder à sociedade precipuamente com sua função finalística.

Em sendo assim, o resgaste da autonomia da Polícia Federal evidenciada no texto constitucional de 1988 nesse momento de instabilidade democrática, não pode ser enfrentado por uma norma infraconstitucional que autorizaria, a princípio, a nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de Diretor Geral da Policia Federal, uma vez que os fatos não podem ser dissociados da norma, nem relegar o caráter axiológico desta, segundo o ensinamento do Mestre Miguel Reale em sua obra sobre a Tridimesionalidade do Direito (Reale, Miguel.

Teoria Tridimensional do Direito. 5ª ed., Editora Saraiva, São Paulo, 2003.). Além dos princípios constitucionais elencados na decisão do Ministro Alexandre de Morais, é fato público e notório a proximidade do Delegado supracitado com a família do Chefe do Executivo Nacional, bem como as investigações recentes autorizadas pela Justiça e desencadeadas pelo exercício fiscalizador do Legislativo em desfavor daquela.

É de conhecimento geral, ainda, que, antes da decisão acima mencionada, o Superintendente da Polícia Federal do Rio de Janeiro conduzia as investigações que envolvem um dos filhos do Presidente da República.

 Vale ressaltar, a posteriori, que as primeiras decisões tomadas pelo novo Diretor Geral da Polícia Federal, Delegado Rolando Alexandre de Souza (segundo da hierarquia da ABIN, só abaixo de Ramagem, quando este era seu comandante maior) no cargo de Diretor Geral da Polícia Federal, quais sejam: o convite para que o até então Superintendente da Polícia Federal do Rio de Janeiro integrasse a Direção Executiva da Polícia Judiciária da União, exercendo ali funções meramente administrativas, em detrimento das ações investigativas, que incluíam as realizadas em desfavor do Chefe do Executivo Nacional; bem como a troca de algumas outras Superintendência, inclusive a de Pernambuco citada por Moro em seu depoimento prestado perante os Delegados Federais que apuram denúncia contra o Presidente da República no Inquérito nº 4831 no STF, sob a relatoria do Min. Celso de Mello, não soaram muito bem dentro da própria corporação, nem no meio da sociedade civil organizada. Nessa situação, tais desdobramentos recentes da decisão monocrática do STF, que suspendeu a nomeação de Ramagem para o cargo de Diretor da Polícia Federal, embora tenham acontecidos após aquela, são de suma importância para compreensão do cenário atual em nosso país.

Estamos longe de um desfecho final para esta novela, que insiste em nos mostrar que qualquer semelhança com fatos e personagens do passado não é mera coincidência, mas uma triste realidade. O combate a corrupção e a outras mazelas sociais situadas sobre o crivo das atribuições da Polícia Federal passa, necessariamente, por uma ampla autonomia institucional, não tomando como parâmetro uma lei que remonta à época da Ditadura Militar, sobretudo diante do estado de anomia social existente.

 Num momento findo de análise, mister salientar que a Polícia Judiciária da União, em tempos vindouros, deve cumprir o papel constitucional para o qual fora erigida, sobrevivendo a Governos descompromissados com a Democracia. Tal resgaste de sua identidade tem como premissa a necessidade de reflexões fisiológicas e teleológicas no que concerne ao conceito de autonomia preconizada pelo texto constitucional (art. 144,§ 1ª), as quais, além de lhe conferir o caráter autônomo, possibilitarão realizar as reformas estruturais necessárias (art. 144, § 7º), para garantia da Ordem Jurídica Justa e o bem comum, essas funções precípuas da polícia Judiciária da União".

· Informações históricas contidas nesse texto foram obtidas através do historiador Eduardo Bueno (Buenas ideias, 2020).

Por George Magno / Advogado inscrito na OAB/PI.

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Encerrada em 31/05/2020 11:41

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